sábado, 17 de março de 2012

PAINTBALL DO CRIME: TREINAMENTO DOS "BALA NA CARA"


Sítio de traficante tinha campo de treinamento. Líder de gangue do bairro Bom Jesus mantinha estrutura em Taquara para preparação de criminosos - EDUARDO TORRES, ZERO HORA 17/03/2012

Ao mobilizarem uma operação para prender o principal líder da quadrilha dos Bala na Cara em liberdade – Cristian dos Santos Ferreira, o Nego Cris, 27 anos – agentes do Departamento Estadual do Narcotráfico (Denarc) encontraram algo maior. O sítio na zona rural de Taquara escondia um campo de paintball para o treinamento de criminosos.

Com uma grade pouco chamativa e uma casa de campo pequena, de madeira, o sítio servia de fachada para um campo aos fundos. Conforme testemunhas, nos finais de semana, aquele cenário se transformava, com a chegada de carros esportivos e homens em atitude suspeita.

– O papel do Nego Cris na organização sempre foi de retaguarda e coordenação. Ultimamente, com muitos integrantes presos, ele adquiriu maior importância no momento de decidir os próximos passos do bando. O sítio era local de treinamento para criminosos – explicou o delegado Mario Souza, que comandou pelo menos um mês de buscas.

Foram apreendidos um rifle e três pistolas de pressão usados nas atividades. Segundo o levantamento do Denarc, o material servia para aulas de tiros e estratégias para proteção de bocas de fumo e conquista de novos pontos aos criminosos. O sítio virou uma base de guerra dos Bala, gangue que atua principalmente na vila Bom Jesus, na Capital.

Como o local era vigiado – havia câmeras escondidas no portão e até na estrada de chão batido que dá acesso ao sítio –, os policiais apelaram para estratégias de disfarce durante a investigação, como a vigilância de agentes de bicicleta e a cavalo.

Dentro da casa, o aparato de segurança se repetia. Havia pelo menos quatro monitores transmitindo as imagens captadas pelas câmeras de vigilância. Uma das câmeras estava acoplada a um helicóptero de brinquedo, que funcionava por controle remoto. Foram apreendidas uma pistola .380 e um revólver calibre 38, de oito polegadas, uma arma rara.

– Precisávamos encontrar o momento adequado para surpreendê-lo – afirmou o delegado.

A hora certa veio antes do amanhecer. Cris estava com a companheira e outra parente quando foi surpreendido. Ele foi preso sem oferecer resistência.


Dos bailes para a cadeia

A escalada de Cristian dos Santos Ferreira, o Nego Cris, entre os Bala na Cara chegava ao topo em 2008, quando prosperavam bailes funk organizados por ele. A suspeita é de que serviriam para lavagem de dinheiro do tráfico, segundo os investigadores. O ano de 2008 também ficou marcado por uma tragédia: o chão do local em que era realizado um baile organizado por ele, em uma casa noturna da Avenida Protásio Alves, desabou. Cerca de cem pessoas ficaram feridas, entre elas uma jovem que teve uma perna amputada.

A prisão de Nego Cris, ontem, transfere um problema para as autoridades penitenciárias do Estado.

Autuado em flagrante por porte ilegal de armas, ele foi encaminhado ao Presídio Central. Lá, encontrará um clima tenso, e será um dos líderes da facção que mais cresce nas cadeias gaúchas.

Há duas semanas são anunciadas rebeliões entre as galerias a mando dos Bala na Cara, que estariam em conflito com outra facção – os Abertos. O Presídio Central e a Penitenciária Estadual do Jacuí (PEJ), em Charqueadas, seriam os principais palcos dessa disputa por poder.